Cartografias do Self
Organizando as gavetas para a entrada de um novo ano!
Por Isabel Perides
Esta reflexão nasceu de um momento de síntese em uma análise de grupo. Ao ser questionada sobre qual havia sido o meu percurso, minha psicanalista ouviu atentamente e resumiu a minha trajetória e concluiu: "Interessante... o Direito como o pai castrador; a Geografia como o mundo e suas cartografias, onde você saiu em busca de si; e, finalmente, a psicanálise como o retorno para si". A partir dela, comecei a organizar as gavetas da alma para o início de uma nova jornada que se aproxima.
O meu caminho intelectual tem sido, portanto, um percurso multifacetado, onde disciplinas aparentemente díspares se entrelaçam como camadas de um mapa. O Direito, minha formação inicial, materializou exatamente esse universo da lei como uma estrutura paterna e impositiva. Ali, encontrei o Estado com suas normas rígidas ... um aparato de controle social que, sob a lente marxista, ecoa as relações de poder e alienação descritas por Marcuse e Althusser. Naquele cenário, a repressão não era mera abstração, mas uma força que moldava meu olhar, suprimindo desejos em nome da ordem produtiva.
A Geografia chegou em meu caminho como um convite ao oposto: a saída para o mundo. Foi uma exploração dos mapas, da terra como mãe afetuosa e acolhedora, repleta de horizontes infinitos. Foi uma viagem real, cruzando fronteiras físicas que, confesso, me assustavam. Traçar rotas por continentes e culturas propiciou, no cerne, essa odisseia interna em busca de mim mesma, onde o espaço geográfico se torna espelho (e não palco) da experiência humana. Milton Santos e David Harvey me ajudaram a compreender que essa exploração não era apenas física, mas uma resistência frente à totalização do capital que tenta alienar o indivíduo de sua raiz territorial.
Agora, como o "retorno para si" profetizado na análise, a psicanálise chega e me convida a um mergulho profundo no território invisível do interior. As estruturas freudianas ... o Id, o Ego e o Superego ... revelam os conflitos psíquicos como verdadeiros mapas do eu, povoados por abismos e pontes. Essa cartografia interna não é estática; é dinâmica e marcada por tensões que, como Wilhelm Reich bem pontuou, integram o marxismo para mostrar como as estruturas de poder externas se infiltram em nosso íntimo.
A lei externa do Direito confronta-se com o Id; a busca por mapas na Geografia desdobra-se na navegação do Ego. A psicanálise, por fim, oferece as ferramentas para reconciliar esses elementos. Com Fromm e Žižek, compreendi que a autorrealização surge da dialética entre desejo e estrutura. Assim, minha jornada não é linear, mas um palimpsesto de camadas que se sobrepõem em uma busca eterna pelo eu integral.
Isabel Perides (25 de dezembro de 2025)
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